quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Triunfo – A flecha do Cupido (4 de 5)


Gary era um homem bonito, com cabelo bem cortado, barba de fios finos e trejeitos femininos. Era o responsável por organizar os encontros-relâmpago do Single’s Pub e estava assustado com a morte de seus clientes. “Fiquem à vontade, falem com quem quiserem”, dizia o gerente do estabelecimento. “Só, por favor, não falem dos assassinatos. Não queremos assustar os clientes. Já perdemos muitos que eram assíduos.”

O Single’s Pub era um bar muito bem decorado. Durante o dia funcionava como um pub comum, mas no início da noite se transformava. Um grande círculo era feito com vinte mesas, que receberiam vinte casais. Cada casal tinha três minutos para se conhecer. Então, soava uma campainha indicando que os homens deveria ir para a mesa à sua direita. Ao final, todos preenchiam fichas dizendo quais pessoas mais tinham impressionado e porque. Enquanto os participantes tinham liberdade para continuar no bar, Gary analisava as fichas, tentando juntar os casais que tinham se entrosado mais. Fora ele que juntou Leo e Jenny na semana anterior e Mike e Ruth há poucos dias.

“O senhor já notou alguém estranho nesses encontros?”, Linda Grant perguntou. O homem sorriu. “Minha querida, são encontros-relâmpagos. Se essas pessoas não fossem estranhas, não precisariam estar aqui.”
Alex e Linda decidiram participar do encontro naquela noite. Talvez assim poderiam se aproximar do assassino sem levantar suspeita. Para passarem despercebidos, os dois foram vestidos como se realmente investissem no encontro. Quando a detetive chegou, no horário combinado, Drake ficou boquiaberto. A ex-ginasta tinha braços muito fortes, sem perder a feminilidade Ela usava um vestido exageradamente curto que ressaltava suas pernas e havia trocado os tradicionais óculos escuros por uma sombra escura. Se havia um assassino naquele bar, ele estaria de olho nela.

O sargento Drake estava apaixonado. Conhecia Linda há apenas um dia, mas não imaginava sua vida sem ela. Em alguns momentos do dia até se esquecia da morte de seu antigo parceiro. “Você está linda”, ele disse. Grant corou. “E você terá seus três minutos para me convencer de que é o cara certo, como todos os outros!”

Os policiais se posicionaram nas mesas de forma a só se encontrar no último momento. Assim, poderiam trocar suas impressões antes que o assassino pudesse deixar o bar. Alex Drake conversou com muitas mulheres. Algumas pareciam psicopatas, mas ele estava convencido de que só um homem seria capaz de subjugar duas pessoas ao mesmo tempo, carregar seus corpos e ainda elaborar uma cena amarrando-os. Ele deixava as mulheres falarem e aproveitava para observar os homens mais próximos. Um deles se destacou. Usava camisa de flanela, tinha cabelos crespos e o tamanho certo para derrubar uma pessoa com um simples golpe.

Neste mesmo tempo, de três em três minutos, Linda Grant conversava com os homens, usando sua experiência de tantos anos enfrentando os piores tipos de criminosos para traçar um perfil de cada um dos potenciais suspeitos. Em geral, os homens pareciam amedrontados e incapazes de fazer qualquer mal, mas ela sabia o quanto um assassino podia esconder sua verdadeira face.

Quando, enfim, chegaram os três minutos finais, duas horas depois de os encontros começarem, Alex e Linda ficaram cara a cara. “O sujeito de camisa xadrez é o meu suspeito. Ele é forte e tenho quase certeza que há uma corda na bolsa que ele carrega. O que acha?”, o sargento questionou. A detetive não concordava. “Prefiro ir atrás do número sete”, ela apontava para um homem magro, alto e louro. “Ele estava com um corte na palma da mão esquerda. Acho que pode ser por manusear flechas.”

“Aquele magrelo?”, a voz de Drake saiu mais alta do que ele esperava. “Certamente se cortou fazendo uma salada. Ele não teria força para matar um homem como Mike Porter. De qualquer forma, siga seus instintos. Quando acabar eu vou atrás do grandão e você segue o magrelo. Nos ligamos mais tarde, ok?”

A campainha tocou e Gary passou para recolher as fichas de todos. O grandão foi o primeiro a ir embora, sem esperar o resultado das combinações de Gary. Provavelmente já tinha escolhido seus alvos. De longe, Alex piscou para Linda e foi atrás do homem de camisa de flanela. Ela continuava no bar, de olho no magrelo com o corte na mão.

O suspeito morava longe. Pegou um ônibus que ia para um subúrbio da cidade. Drake, em seu carro, o seguiu. O grandão desceu em um ponto escuro, perto de um bosque. Um lugar perfeito, na opinião do sargento, para matar pessoas sem ser visto ou ouvido. Com o carro estacionado, o policial seguiu o sujeito a pé.

O homem de camisa de flanela acidentalmente derrubou a sacola que carregava e Drake pode dar uma boa olhada no conteúdo. Havia um bom pedaço de corda, de espessura semelhante à usada para unir os corpos das vítimas, além de um pedaço de meio metro de cano, que poderia ser usado para golpear alguém, e umas poucas ferramentas.

Drake estava determinado a ver onde o homem morava. Ele já tinha investigado dois ou três serial killers e sabia que casas com porões, sem vizinhos próximos e com garagens fechadas eram espaços perfeitos para matar. Se o cara tivesse ainda uma van ou caminhonete para transportar os corpos, estaria praticamente assinando a confissão de culpa.

Quando o homem finalmente chegou em casa, após caminhar por cerca de quinze minutos em uma estrada que cortava o bosque, o sargento ficou morbidamente satisfeito com o que viu. A casa era isolada por muros, o que dificultaria uma fuga do terreno, caso uma das vítimas conseguisse escapar. A iluminação era extremamente precária e, fora algumas corujas, não havia viva alma nas redondezas. Drake esperou o homem entrar e depois pulou o muro para ver a casa mais de perto.

Por uma das janelas, o policial reparou que o grandão tinha equipamentos de caça e uma cabeça de veado na parede, ou seja, ele sabia como matar um ser de grande porte e já havia feito isso antes. Não seria complicado para ele exterminar um empresário ou um vendedora de discos usados. Alex viu ainda o homem abrir a porta que dava acesso ao porão e descer com a sacola na mão.

O sargento deu a volta na casa, em busca de algum acesso externo ao subsolo. Se ouvisse algum grito ou barulho estranho, invadiria imediatamente. Em vez disso, ao chegar aos fundos, encontrou muitas cordas, que desciam do telhado da casa. Apoiados na parede, alguns canos e telhas. O sujeito estava fazendo uma reforma na casa, o que explicaria o conteúdo da sacola.

Alguns passos em uma escada de madeira indicaram que o cara de camisa de flanela estava voltando para o térreo. Pelas janelas da casa, Drake acompanhava a movimentação. Além dele, havia outra pessoa na casa. Uma adolescente de cerca de 16 anos. Ela não parecia amedrontada. O homem deu alguns dólares para ela, que se despediu e saiu da casa.

Era uma babá. Na mesa da cozinha, duas crianças tomavam sorvete. Tinham menos de dez anos, Alex não conseguia precisar. Sob a lareira, uma foto do grandão com uma mulher morena e uma urna. Provavelmente as cinzas da esposa. O sujeito era viúvo, se dividia entre o trabalho, a reforma da casa e a criação dos filhos. Ia ao Single’s Pub para tentar conhecer novas pessoas, mas sua saída antes que Gary computasse os resultados das fichas mostravam que ele ainda não estava preparado para um novo relacionamento. Aquele homem nunca seria o assassino.

O sargento Alex Drake pulou o muro de volta e seguiu na estrada até onde tinha estacionado o carro. Tentava ligar para o celular de Linda, mas ela não atendia. Provavelmente estava com o telefone no modo silencioso enquanto seguia o outro suspeito. O policial esperava que sua parceira tivesse mais sorte que ele.

Às margens do Blue Lake, alguns remadores amadores guardavam seus barcos após uma agitada noite de treino. Os bares que atraíam os turistas estavam com o movimento fraco, por conta do vento frio que soprava. Um adolescente passeava com seus cachorros enquanto fumava escondido dos pais.

Em uma cabana à beira do lago, a música alta impedia que Linda ouvisse seu telefone tocar. Era o Allegro da Primavera. As Quatro Estações de Vivaldi. A detetive gostava muito de música clássica, mas naquele momento ela mal conseguia prestar atenção no que estava tocando. Estava focada no homem alto e magro, com o corte na mão, que ela vira no encontro-relâmpago. Ele conferia se uma flecha estava afiada e a colocava em sua balestra. Linda queria correr dali, avisar seu parceiro, mas estava amarrada, amordaçada e na mira do Cupido.

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