Gary era um homem bonito, com cabelo bem cortado, barba de fios finos e trejeitos femininos. Era o responsável por organizar os encontros-relâmpago do Single’s Pub e estava assustado com a morte de seus clientes. “Fiquem à vontade, falem com quem quiserem”, dizia o gerente do estabelecimento. “Só, por favor, não falem dos assassinatos. Não queremos assustar os clientes. Já perdemos muitos que eram assíduos.”
O Single’s Pub era um bar muito bem decorado. Durante o dia
funcionava como um pub comum, mas no início da noite se transformava. Um grande
círculo era feito com vinte mesas, que receberiam vinte casais. Cada casal
tinha três minutos para se conhecer. Então, soava uma campainha indicando que
os homens deveria ir para a mesa à sua direita. Ao final, todos preenchiam
fichas dizendo quais pessoas mais tinham impressionado e porque. Enquanto os
participantes tinham liberdade para continuar no bar, Gary analisava as fichas,
tentando juntar os casais que tinham se entrosado mais. Fora ele que juntou Leo
e Jenny na semana anterior e Mike e Ruth há poucos dias.
“O senhor já notou alguém estranho nesses encontros?”, Linda
Grant perguntou. O homem sorriu. “Minha querida, são encontros-relâmpagos. Se
essas pessoas não fossem estranhas, não precisariam estar aqui.”
Alex e Linda decidiram participar do encontro naquela noite.
Talvez assim poderiam se aproximar do assassino sem levantar suspeita. Para
passarem despercebidos, os dois foram vestidos como se realmente investissem no
encontro. Quando a detetive chegou, no horário combinado, Drake ficou
boquiaberto. A ex-ginasta tinha braços muito fortes, sem perder a feminilidade
Ela usava um vestido exageradamente curto que ressaltava suas pernas e havia
trocado os tradicionais óculos escuros por uma sombra escura. Se havia um
assassino naquele bar, ele estaria de olho nela.
O sargento Drake estava apaixonado. Conhecia Linda há apenas
um dia, mas não imaginava sua vida sem ela. Em alguns momentos do dia até se
esquecia da morte de seu antigo parceiro. “Você está linda”, ele disse. Grant
corou. “E você terá seus três minutos para me convencer de que é o cara certo,
como todos os outros!”
Os policiais se posicionaram nas mesas de forma a só se
encontrar no último momento. Assim, poderiam trocar suas impressões antes que o
assassino pudesse deixar o bar. Alex Drake conversou com muitas mulheres.
Algumas pareciam psicopatas, mas ele estava convencido de que só um homem seria
capaz de subjugar duas pessoas ao mesmo tempo, carregar seus corpos e ainda
elaborar uma cena amarrando-os. Ele deixava as mulheres falarem e aproveitava
para observar os homens mais próximos. Um deles se destacou. Usava camisa de
flanela, tinha cabelos crespos e o tamanho certo para derrubar uma pessoa com
um simples golpe.
Neste mesmo tempo, de três em três minutos, Linda Grant
conversava com os homens, usando sua experiência de tantos anos enfrentando os
piores tipos de criminosos para traçar um perfil de cada um dos potenciais
suspeitos. Em geral, os homens pareciam amedrontados e incapazes de fazer
qualquer mal, mas ela sabia o quanto um assassino podia esconder sua verdadeira
face.
Quando, enfim, chegaram os três minutos finais, duas horas
depois de os encontros começarem, Alex e Linda ficaram cara a cara. “O sujeito
de camisa xadrez é o meu suspeito. Ele é forte e tenho quase certeza que há uma
corda na bolsa que ele carrega. O que acha?”, o sargento questionou. A detetive
não concordava. “Prefiro ir atrás do número sete”, ela apontava para um homem
magro, alto e louro. “Ele estava com um corte na palma da mão esquerda. Acho
que pode ser por manusear flechas.”
“Aquele magrelo?”, a voz de Drake saiu mais alta do que ele
esperava. “Certamente se cortou fazendo uma salada. Ele não teria força para
matar um homem como Mike Porter. De qualquer forma, siga seus instintos. Quando
acabar eu vou atrás do grandão e você segue o magrelo. Nos ligamos mais tarde, ok?”
A campainha tocou e Gary passou para recolher as fichas de
todos. O grandão foi o primeiro a ir embora, sem esperar o resultado das
combinações de Gary. Provavelmente já tinha escolhido seus alvos. De longe,
Alex piscou para Linda e foi atrás do homem de camisa de flanela. Ela
continuava no bar, de olho no magrelo com o corte na mão.
O suspeito morava longe. Pegou um ônibus que ia para um
subúrbio da cidade. Drake, em seu carro, o seguiu. O grandão desceu em um ponto
escuro, perto de um bosque. Um lugar perfeito, na opinião do sargento, para
matar pessoas sem ser visto ou ouvido. Com o carro estacionado, o policial
seguiu o sujeito a pé.
O homem de camisa de flanela acidentalmente derrubou a
sacola que carregava e Drake pode dar uma boa olhada no conteúdo. Havia um bom
pedaço de corda, de espessura semelhante à usada para unir os corpos das
vítimas, além de um pedaço de meio metro de cano, que poderia ser usado para
golpear alguém, e umas poucas ferramentas.
Drake estava determinado a ver onde o homem morava. Ele já
tinha investigado dois ou três serial killers e sabia que casas com porões, sem
vizinhos próximos e com garagens fechadas eram espaços perfeitos para matar. Se
o cara tivesse ainda uma van ou caminhonete para transportar os corpos, estaria
praticamente assinando a confissão de culpa.
Quando o homem finalmente chegou em casa, após caminhar por
cerca de quinze minutos em uma estrada que cortava o bosque, o sargento ficou
morbidamente satisfeito com o que viu. A casa era isolada por muros, o que
dificultaria uma fuga do terreno, caso uma das vítimas conseguisse escapar. A
iluminação era extremamente precária e, fora algumas corujas, não havia viva
alma nas redondezas. Drake esperou o homem entrar e depois pulou o muro para
ver a casa mais de perto.
Por uma das janelas, o policial reparou que o grandão tinha
equipamentos de caça e uma cabeça de veado na parede, ou seja, ele sabia como
matar um ser de grande porte e já havia feito isso antes. Não seria complicado
para ele exterminar um empresário ou um vendedora de discos usados. Alex viu
ainda o homem abrir a porta que dava acesso ao porão e descer com a sacola na
mão.
O sargento deu a volta na casa, em busca de algum acesso
externo ao subsolo. Se ouvisse algum grito ou barulho estranho, invadiria
imediatamente. Em vez disso, ao chegar aos fundos, encontrou muitas cordas, que
desciam do telhado da casa. Apoiados na parede, alguns canos e telhas. O
sujeito estava fazendo uma reforma na casa, o que explicaria o conteúdo da
sacola.
Alguns passos em uma escada de madeira indicaram que o cara
de camisa de flanela estava voltando para o térreo. Pelas janelas da casa,
Drake acompanhava a movimentação. Além dele, havia outra pessoa na casa. Uma
adolescente de cerca de 16 anos. Ela não parecia amedrontada. O homem deu
alguns dólares para ela, que se despediu e saiu da casa.
Era uma babá. Na mesa da cozinha, duas crianças tomavam
sorvete. Tinham menos de dez anos, Alex não conseguia precisar. Sob a lareira,
uma foto do grandão com uma mulher morena e uma urna. Provavelmente as cinzas
da esposa. O sujeito era viúvo, se dividia entre o trabalho, a reforma da casa
e a criação dos filhos. Ia ao Single’s Pub para tentar conhecer novas pessoas,
mas sua saída antes que Gary computasse os resultados das fichas mostravam que
ele ainda não estava preparado para um novo relacionamento. Aquele homem nunca
seria o assassino.
O sargento Alex Drake pulou o muro de volta e seguiu na
estrada até onde tinha estacionado o carro. Tentava ligar para o celular de
Linda, mas ela não atendia. Provavelmente estava com o telefone no modo
silencioso enquanto seguia o outro suspeito. O policial esperava que sua
parceira tivesse mais sorte que ele.
Às margens do Blue Lake, alguns remadores amadores guardavam
seus barcos após uma agitada noite de treino. Os bares que atraíam os turistas
estavam com o movimento fraco, por conta do vento frio que soprava. Um adolescente passeava com seus cachorros enquanto fumava escondido dos pais.
Em uma cabana à beira do lago, a música alta impedia que
Linda ouvisse seu telefone tocar. Era o Allegro da Primavera. As Quatro Estações
de Vivaldi. A detetive gostava muito de música clássica, mas naquele momento
ela mal conseguia prestar atenção no que estava tocando. Estava focada no homem
alto e magro, com o corte na mão, que ela vira no encontro-relâmpago. Ele
conferia se uma flecha estava afiada e a colocava em sua balestra. Linda queria
correr dali, avisar seu parceiro, mas estava amarrada, amordaçada e na mira do
Cupido.
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