segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Triunfo – Agridoce (1 de 5)


“Comissário Fisk, precisamos de ajuda!”, gritava o sargento Milton Schulz. O dia estava particularmente quente. Escondidos atrás de uma pilha de contêineres, Schulz e seu parceiro, o detetive Alex Drake, esperavam reforços para chegar à beira do cais e dar um fim àquela loucura.

Quando os dois chegaram à delegacia central de Blue Lake City acharam que seria um dia normal. E em dias normais em Blue Lake City os policiais basicamente aplicavam multas e preenchiam papeladas. Eram raros os momentos tensos como aquele.

Ninguém sabia o nome verdadeiro da mulher, mas os tabloides a chamavam de Agridoce. Era uma ladra e assassina. Já havia sido presa algumas vezes, mas sempre dava um jeito de escapar. Naquela manhã, ela invadiu o porto de Blue Lake City em busca de um contêiner específico, que ainda estava procurando. Ela já havia matado alguns estivadores que cruzaram seu caminho e dois seguranças do porto. Schulz e Drake estavam por perto e ouviram os tiros.

“Abandonem o lugar”, gritava o comissário Jeremiah Fisk pelo rádio. “Ninguém entra no porto até que o Major chegue!” Aquelas ordens incomodavam os dois policiais. Eles não gostavam de ter que esperar alguém para agir. Eram policiais à moda antiga e preferiam pôr a mão na massa em vez de esperar que outra pessoa fizesse o trabalho por eles.

Schulz e Drake eram amigos há muitos anos. Cursaram a academia juntos e Alex era padrinho do filho de Milton. Provavelmente se Drake não tivesse um temperamento tão explosivo já fosse sargento como seu parceiro.

“Comissário, ela já matou algumas pessoas e há mais estivadores no porto. Se continuar assim, outras pessoas vão morrer”, o sargento tentava argumentar. “Não podemos ficar parados enquanto mais inocentes são feridos.”

O sargento Schulz segurou com firmeza seu revolver e fez sinal para que Drake o seguisse. No rádio, o comissário de polícia gritava. “Fiquem onde estão! Não ousem ir atrás da mulher! Esperem pelo Major!”
Os dois avançavam aos poucos pelo porto. “Você viu aqueles namorados que apareceram mortos e amarrados?”, Milton gostava de jogar conversa fora nos momentos de tensão. “Gostaria de investigar esse caso quando sairmos daqui”, ele fazia planos, como se isso pudesse evitar o pior dos destinos.

Agridoce tentava abrir um contêiner. Ela tinha três capangas, que também procuravam alguma coisa. Schulz observava com cautela, tentando traçar a melhor estratégia para deter a mulher. “Alex, acho melhor nos dividirmos”, disse Milton, mas ao se virar, viu que o detetive já estava longe. Drake corria sobre alguns contêineres na direção de Agridoce.

Era hora de agir, Milton sabia. Com seu revólver de seis tiros ele conseguiu abater facilmente os capangar da bandida, acertando seus joelhos ou ombros. Os tiros atraíram a atenção de Agridoce, mas não o suficiente para que Alex a prendesse. Foi então que tudo começou.

Do alto do contêiner, Drake sentiu uma brisa agradável. O sol brilhava belo no céu e suas roupas pareciam mais confortáveis do que de costume. O detetive já não lembrava mais o que fazia ali, quem estava perseguindo. Parou sobre o contêiner e ficou admirando a vista do mar. Então, de repente, ele olhou para baixo. Eram poucos metros até o chão, mas parecia que ele estava na beirada de uma ponte. Seu corpo era atraído pela gravidade e estava complicado se equilibrar, permanecer de pé. Alex suava frio e tremia. Tinha um pouco de medo de altura, mas era na verdade a única coisa que temia.

Agridoce tinha esse efeito sobre as pessoas. De alguma forma ela conseguia manipular os cérebros de suas vítimas. Era como se ela entrasse no hipocampo e fizessem com que os dados sensoriais fossem interpretados da maneira que ela quisesse. Primeiro, ela dava uma sensação agradável, fazendo com que seu alvo ficasse desestabilizado. Depois, transformava aquela sensação na pior possível, levando à tona o pior medo do indivíduo. Por isso era chamada de Agridoce.

Ao ver que seu parceiro estava em apuros, Schulz partiu para atacar a mulher. Deu alguns tiros, mas ainda estava um pouco distante e não conseguiu acertar. Ele via Alex em cima do contêiner tentando se afastar de uma beirada e então se aproximando perigosamente de outra, em uma coreografia que se repetia.

De passo em passo, o sargento chegava mais perto do campo de influência da criminosa. Primeiro viu que havia um cãozinho no cais, mas continuava focado em sua missão. Depois notou uns gatinhos e se lembrou do gato de seu filho, um pequeno persa branco, muito peludo e dócil. Ele abaixou para brincar com um dos animais. Milton era um homem feliz, mas estava muito sorridente naquele momento.

Com os dois homens dominados, Agridoce continuou sua busca. Em um dos contêineres, achou uma máquina. Parecia uma grande arma. Tentou ligar o equipamento, mas não havia fonte de energia. Isso a enfureceu profundamente. Alex sentiu essa fúria. Tinha a impressão de que estava cada vez mais alto e que a superfície diminuía sob seus pés. O medo fazia com que ele rangesse os dentes.

Schulz estava agachado, brincando com o gato. O bichano se deixava acariciar e ronronava. Mas a fúria de Agridoce fez com que o cenário mudasse. O gato arranhou a mão do sargento. Primeiro sangrou um pouco, mas em seguida uma aranha saiu do corte. Milton conseguiu jogá-la no chão e matá-la. Tinha pavor de aranhar. Então ele sentiu algumas patas se mexendo em sua mão. Outra aranha saiu do corte. E mais uma. E outra. Eram dezenas de aracnídeos correndo pelo corpo de policial, que tentava se livrar dos animais enquanto eles só aumentavam de número e de tamanho.

“Me perdoe, Judith”, disse Milton, como se sua esposa pudesse ouvi-lo. Então apontou o revólver para a própria cabeça e atirou.

Do alto do contêiner, Alex viu o amigo se matar, para fugir da agonia. E viu uma rajada de fogo surgir do céu e acertar Agridoce no peito. Seu medo sumiu em um segundo e ele se deu conta do que havia acontecido. Milton estava morto e por pouco ele próprio não havia morrido.

No céu claro daquela manhã, descendo como um anjo sem asas, Drake viu seu salvador se aproximar. Com seu uniforme verde, capa vermelha e máscara, o protetor de Blue Lake City havia novamente detido a ameaça. Os estivadores que estavam se escondendo voltaram a aparecer. Todos aplaudiam e gritavam o nome do herói. Gritavam o nome do Major Triunfo.

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