quinta-feira, 10 de julho de 2008

Recomeço

Em frente ao espelho, Fernanda dava os últimos retoques na maquiagem. Rímel, blush, batom, sombra e um pouco mais. Estava alguns minutos atrasada, mas Rodrigo certamente entenderia. Escolheu um vestido em meio a mais de uma dúzia, se arrumou, respirou fundo e saiu.

O que a levou a Fortaleza foi uma paixão antiga, nascida nos corredores do edifício. Rodrigo era o vizinho do lado direito, com quem ela sempre conversava quando se esbarravam. Era bonito, educado e não gostava de barulho. Já ela, não tão bonita e muito educada, acompanhava cada ruído dele. Numa dessas vezes, ouviu o rapaz comentar com o porteiro que iria passar férias no Ceará.

“Vai mesmo?”, perguntou ela. “Que coincidência, eu também vou”, mentiu. Como ele partiria sozinho, combinaram de fazer companhia um ao outro. Compraram as passagens juntos, reservaram o hotel e acertaram alguns passeios. Se, numa noite qualquer, ela pudesse repousar a cabeça no ombro dele, já teria valido a pena pedir folga no trabalho.

Fernanda tinha um longo histórico de decepções amorosas. Tinha doutorado em se apaixonar e não ser retribuída. O pior era quando os homens se aproximavam, se declaravam e por completa covardia ela declinava qualquer proposta. Seu último beijo estava para completara aniversário e só aquele vizinho em férias poderia salvá-la do desespero.

Pegou o elevador e desceu. Tinham marcado no lobby, às nove em ponto. Sairiam para jantar e depois decidiriam o que mais aquela noite prometia. Já passavam das nove e quinze, mas Rodrigo não repararia. Mulheres eram assim mesmo, como uma refeição: a demora abre ainda mais o apetite.

A menina encontrou Rodrigo no bar próximo à entrada do hotel. Ele estava bem vestido, com a pele bronzeada pela exposição excessiva ao sol durante a tarde, mais bonito que o de costume. Mas para a surpresa dela não estava sozinho. “Fernanda, essa aqui é a Vanessa. Estava te esperando e a gente começou a conversar. Ela é de São Paulo. Espero que não se importe, mas a convidei para jantar com a gente.”

“Não me importo”, ela respondeu. “Demorei porque não estou me sentindo nada bem. Podem ir. A gente se fala amanhã.” Os dois partiram. Ela viu todo o investimento na viagem indo embora e se chamou de burra por diversas vezes; algumas em voz alta. Sentou ao balcão do bar e pediu um drinque.

Um homem ao lado dela, muito alto e charmoso, com seus óculos de aros arredondados, encantador como ator de novelas se aproximou. “Não pude deixar de ouvir que está se sentindo mal. Não encare como cantada, mas eu sou médico. Por que não me conta o que está sentindo?”

“Coração partido”, Fernanda deixou escapar. O homem sorriu e lhe ofereceu outra bebida. Diante daquela promessa de recomeço, ela decidiu arriscar. Uma atitude inesperada até para ela. Deu dois beijinhos, se despediu e voltou para o quarto.

Um comentário:

Lúcia Cúrio disse...

A emoção toma conta de mim cada vez que leio os seus textos. Tenho vontade de mostrar a todos o grande escritor. Um dia voce sera recompensado. Queria poder te ajudar a editar o seu livro.
Boa sorte!