quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

O fim – Ainda não acabou (4 de 3?)


Não chegou a paz celestial que ele esperava, nem o tormento infernal que a filha tinha prometido. O destino de Alberto foi mais, digamos, úmido. Deitado na grama, arremessado ao chão pelo impacto da queda do meteoro, ele foi acordado pelas lambidas do vira-latas Hugo.

“Vivo”, pensou ele. “Eu estou vivo. Hugo está vivo. Estamos todos vivos. Será?” O primeiro impulso do velho foi puxar o rádio do bolso e tentar sintonizar alguma estação. Uma música. Roberto Carlos. Era o início do Show do Genésio. Nunca tinha sido tão bom ouvir uma canção do rei. Quando o comunicador voltou, as notícias eram boas.

“Minha amiga, meu amigo do Show do Genésio. Hoje, mais do que nunca, é dia de alegria. Nos últimos três dias nós falamos bastante sobre o meteoro que se aproximava da Terra. Tinha gente até apostando que era o fim do mundo”, um barulhinho no fundo mostrava o quanto aquilo era ridículo. “Pois bem, ontem, no final da noite, os cientistas da Nasa se retrataram e disseram que o meteoro não era tão grande quanto eles calcularam. O meteoro criou uma grande cratera no Parque Nacional de Itatiaia, mas até o momento não tivemos registros de mortos. É dia de alegria, minha gente! Vamos cantar!”

O velho deixou um sorriso largo estampar seu rosto. Estalando os dedos, ele chamou Hugo e correu de volta para a base. Queria, o quanto antes, falar com a filha e dizer que entendia a postura dela e que a perdoava.

Ao chegar à base, contudo, não encontrou os militares. Todos ainda estavam trancados no abrigo subterrâneo e a grande antena de rádio e televisão estava quebrada. Na certa, eles acreditavam que as pessoas haviam morrido com o impacto. Alberto tentou bater na escotilha, chamar pelo nome da filha, mas sabia que era tudo em vão. Carla e seus companheiros estavam incomunicáveis e permaneceriam assim por cinco anos, enquanto houvesse comida estocada.

Alberto voltou para o Rio de Janeiro, para seu apartamento na Tijuca. Em poucos dias, já estava mergulhado novamente em sua rotina. Acordava cedo, ouvia rádio, rezava, fazia exercícios. Tudo o que sempre fizera, como se a raça humana jamais tivesse batido às portas da extinção. Antes de dormir, lembrava da filha. Às vezes, puxava o telefone do gancho para ligar para ela, mas depois lembrava-se que Carla estava isolada em uma base militar. “Sempre me esqueço disso, Hugo”, dizia ele para o cachorro. Velho tem dessas coisas.

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