Não chegou a paz celestial que ele esperava, nem o tormento infernal que a filha tinha prometido. O destino de Alberto foi mais, digamos, úmido. Deitado na grama, arremessado ao chão pelo impacto da queda do meteoro, ele foi acordado pelas lambidas do vira-latas Hugo.
“Vivo”, pensou ele. “Eu estou vivo. Hugo está vivo. Estamos
todos vivos. Será?” O primeiro impulso do velho foi puxar o rádio do bolso e
tentar sintonizar alguma estação. Uma música. Roberto Carlos. Era o início do
Show do Genésio. Nunca tinha sido tão bom ouvir uma canção do rei. Quando o
comunicador voltou, as notícias eram boas.
“Minha amiga, meu amigo do Show do Genésio. Hoje, mais do
que nunca, é dia de alegria. Nos últimos três dias nós falamos bastante sobre o
meteoro que se aproximava da Terra. Tinha gente até apostando que era o fim do
mundo”, um barulhinho no fundo mostrava o quanto aquilo era ridículo. “Pois
bem, ontem, no final da noite, os cientistas da Nasa se retrataram e disseram
que o meteoro não era tão grande quanto eles calcularam. O meteoro criou uma
grande cratera no Parque Nacional de Itatiaia, mas até o momento não tivemos
registros de mortos. É dia de alegria, minha gente! Vamos cantar!”
O velho deixou um sorriso largo estampar seu rosto.
Estalando os dedos, ele chamou Hugo e correu de volta para a base. Queria, o
quanto antes, falar com a filha e dizer que entendia a postura dela e que a
perdoava.
Ao chegar à base, contudo, não encontrou os militares. Todos
ainda estavam trancados no abrigo subterrâneo e a grande antena de rádio e
televisão estava quebrada. Na certa, eles acreditavam que as pessoas haviam
morrido com o impacto. Alberto tentou bater na escotilha, chamar pelo nome da
filha, mas sabia que era tudo em vão. Carla e seus companheiros estavam
incomunicáveis e permaneceriam assim por cinco anos, enquanto houvesse comida
estocada.
Alberto voltou para o Rio de Janeiro, para seu apartamento
na Tijuca. Em poucos dias, já estava mergulhado novamente em sua rotina. Acordava
cedo, ouvia rádio, rezava, fazia exercícios. Tudo o que sempre fizera, como se
a raça humana jamais tivesse batido às portas da extinção. Antes de dormir,
lembrava da filha. Às vezes, puxava o telefone do gancho para ligar para ela,
mas depois lembrava-se que Carla estava isolada em uma base militar. “Sempre me
esqueço disso, Hugo”, dizia ele para o cachorro. Velho tem dessas coisas.
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